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Mau caminho que sabe Bem
Por vezes, ponho-me a pensar o que é que te passou pela cabeça para te apaixonares por mim.
Nos dias em que acordo a transbordar auto-estima, quero acreditar que ficas hipnotizado pelo meu sorriso inocente e me consideras a melhor pessoa do mundo. Que, quando me vês, tudo à nossa volta desaparece, que o mundo para e o teu coração bate mais depressa a cada palavra inteligente e pertinente que eu digo. Tudo isto, claro, enquanto passo a mão pelo meu cabelo loiro e esvoaçante, que condiz perfeitamente com o meu corpo de super modelo e o meu QI fora do normal.
Depois, rio-me às gargalhadas com estas considerações, que não podem estar mais distantes da realidade. O sorriso é tudo menos inocente, a maioria das minhas palavras são impulsivas e nada ponderadas, não sou particularmente bonita e estou muito, muito longe de ser uma pessoa boa e altruísta, capaz de se destacar entre todas as outras alminhas desinteressantes que passeiam pelas ruas. Portanto, se calhar a atração que sentes deve-se unicamente ao meu rabo empinado e ao meu sentido de humor atrevido (que agora te agrada mas, eventualmente, te faria sofrer).
De qualquer forma, desengana-te. Esse fascínio há de te passar rápido. Sou a pior namorada do mundo e a pessoa mais inconstante do nosso Sistema Solar. Não sou capaz de te retribuir como mereces.
Mas de uma coisa podes ter a certeza. Quero mesmo, mesmo muito, que sejas feliz.
(E eu também me quero apaixonar outra vez).
Da minha incursão de ontem pelas redes sociais, quer-me parecer que há quatro tipos de “notícias” de S. Valentim que se destacam no meu feed do facebook:
Atualmente, não namoro. Quando namorava, gostava de manifestações pirosas. E, se me incomodasse a exposição online, não escreveria um blog pessoal, parece-me óbvio.
Os longos textos com que me deparo sobre as vantagens de não namorar fazem-me rir, benevolente. Soam-me a desculpas de quem não faz a mínima ideia do que é amar, e ser amado. Quando o sentimento é verdadeiro e correspondido, amar é prioritário, e torna-nos mais felizes. Torna-nos melhores. Não há relações “sufocantes”, nem falta de tempo, nem problemas incontornáveis quando se ama de verdade. O amor-próprio é essencial, concordo, e é triste e lamentável anularmo-nos perante o outro, mas a partilha e a realização de ser feliz ao lado de quem se ama é o que há de mais bonito no mundo inteiro.
Se podemos viver sem amar? Podemos. Vivemos. Mas… viver feliz sem amar é como comer um pão quentinho acabado de sair do forno a lenha. É ótimo, não é? Sabe bem, não sabe? Mas, para ser mesmo, mesmo perfeito, falta a manteiga.
O amor é a manteiga no pão quentinho que é uma vida feliz.
Houve um tempo (que durou anos!) em que a Ana comprava uma peça de roupa e usava-a até a desgastar, até se sentir apertada ou o tecido rasgar ou desbotar. Namorava-a, devagarinho, na montra da loja, e, depois de a comprar, vesti-la tornava-se uma rotina que a preenchia.
Mas, certo dia, a Ana apercebeu-se que gostava de experimentar.
(Eu sei que, ao falar de carros, podemos usar a expressão test drive, quando temos a oportunidade de conduzir um modelo sem o comprar, sem qualquer compromisso, para termos a certeza da nossa futura decisão de compra. No caso da Ana, não sei se existe uma expressão em inglês; mas o que ela faz é, basicamente, a mesma coisa.)
Há uma política nas lojas em que compra que lhe permite devolver a peça ao fim de um determinado número de dias. Por isso, ela compra, guarda o talão na carteira, e veste-a, entusiasmada. Não assume qualquer compromisso, porque sabe que a pode devolver a qualquer altura e reaver o dinheiro gasto. Só tem de ter cuidado com um pormenor: não causar danos que impeçam a devolução. Danos irreversiveis, que não podem ser disfarçados, são inimigos de quem gosta mais de experimentar do que de adquirir.
Infelizmente, experimentar tem um limite temporal bem definido. A Ana adora experimentar mas há uma altura em que é obrigada a decidir. Se a devolve, e prossegue até à próxima loja, para comprar (e, depois, devolver), a peça de roupa da coleção mais recente, ou se assume que a quer a full time, que é mesmo dela, e deixa passar o prazo de devolução.
É que, depois de tomada a decisão, já não pode voltar atrás.
Por vezes acontece-lhe devolver uma camisola e cruzar-se, uns dias depois, com outra mulher que a traz vestida. Sente uns ciúmes inexplicáveis, irracionais, e apetece-lhe gritar: “hey! Essa era minha!”. Foi, já não é. Tiveste a tua oportunidade, Ana. Desperdiçaste-a porque quiseste experimentar outra e, agora já não há à venda. Essa saudade que estás a sentir é culpa tua.
Por outro lado, se optar por não a devolver, sabe que tem de lhe dar uso. Se nela investiu o seu dinheiro, deve vesti-la. Não pode esquecê-la a um canto, e continuar a experimentar desenfreadamente outras peças de roupa que tenciona descartar quinze dias depois.
Acho que a Ana se habituou a esta nova rotina de comprar, devolver, reaver o dinheiro e comprar outra peça que lhe desperte o interesse, por ser novidade, ou por outro qualquer motivo que nem ela sabe explicar. Não sei se é a sensação de querer algo novo, de fugir da rotina, de vivenciar experiências distintas sabendo que não se está a comprometer.
Não possui, na verdade, mas não se chateia.
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