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A Primeira Vez da Helô

por MPS, em 29.06.14

- Doeu?

Eu tinha 21 anos e nunca o tinha feito, por isso é natural que estivesse curiosa.

 

- Doeu ou não?

 

Conheci a Heloísa o ano passado, no mês de junho. Não eramos grandes amigas, confesso, mas eu estava ansiosa por ouvir a sua história. A Helô é brasileira e estava a estudar em Portugal. Dizem que, no Brasil, era uma rapariga muito atinadinha: pouco frequentadora de festas, fiel ao namorado, álcool só em casamentos e batizados. Drogas, nem vê-las, nem leves nem pesadas, nem coisas nenhuma.

 

Mas depois tinha chegado a Portugal e pronto, isto do Erasmus desgraça uma pessoa. Mas lá está, o Mau caminho sabe Bem e, portanto, a Helô estava a aproveitar ao máximo a fuga à rotina. Eu sei, por experiência própria, que os estudantes Erasmus o fazem: fazem o que, em casa, nunca fariam. Tentam. Experimentam. Arriscam. “Perdem a cabeça” e, por vezes, a dignidade.

 

E é por isso que ela tinha vivido aqui, no Porto, a sua primeira vez.

Já tinha publicado no facebook que o tinha feito, já toda a gente sabia, e contou-me:

- Doeu, sim. Doeu e a minha t-shirt rasgou. E trinquei o lábio com força. Sabes, foi do impacto.

 

Permitam-me que vos explique: é tradição, no Porto, os turistas pagarem aos meninos da Ribeira para mergulharem da Ponte Luíz I (ou D. Luís, como é conhecida) para o rio Douro. Esses miúdos conhecem a forma mais adequada de mergulhar porque o fazem desde sempre, estão mais que habituados e não se magoam.

Os estudantes de Erasmus não estão minimamente preparados para uma aventura deste tipo. Mas muitos acham que não podem sair do Porto sem ter saltado, independentemente da inexperiência e dos riscos que correm. É um fenómeno engraçado, que um dia pode correr muito, muito mal, e que eu tenho acompanhado de perto por conviver bastante com jovens estrangeiros. Eu digo-lhes “é perigoso”; mas eles querem viver a sua primeira vez. Como a Helô.

 

Ela tinha o lábio roxo e inchado mas estava orgulhosa da sua proeza. Eu estava surpreendida. Não imaginei que a t-shirt pudesse rasgar-se só com o embate na água. Deve ter doído muito. Tive medo. Imaginei que ela podia ter morrido, criei todo um drama na minha cabeça. Perguntei-lhe se estava arrependida.

- Eu não! – respondeu-me, aparentemente segura de si.

Sinceramente, duvido. Para a Helô, foi a primeira vez e, provavelmente, a última. Não a imagino a repetir a façanha, sob pena de se magoar a sério.

 

Este ano, por esta altura, a história repete-se e os estudantes Erasmus já estão a planear o próximo salto. Da minha parte, continuo sem ter experimentado, nem está nos meus planos fazê-lo, a curto prazo.

Deixemos isso para os meninos da Ribeira; que eu prefiro-a à segunda à noite sem contacto direto com o rio.

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publicado às 22:26

Sobre a Arrogância dos Portuenses

por MPS, em 27.06.14

Os portuenses têm um orgulho desmedido em si próprios.

 

Acreditam que o Porto é a melhor cidade – não só de Portugal, mas do mundo inteiro! – e que os portuenses são as pessoas mais incríveis da história da humanidade. Têm alguma dificuldade em gostar de Lisboa, e, convenhamos, de tudo o que esteja a sul do rio Douro.

 

As pessoas no Porto têm um sotaque tão acentuado quanto as suas convicções.

E têm uma tendência exagerada para a… não sei bem como dizê-lo parecendo correta. As pessoas no Porto têm uma tendência exagerada para a peixeirada. Para armar a… vocês sabem. E gostam.

 

Mas também gostam de ajudar. Gostam de receber os turistas (e as turistas), e eu já me apercebi, do contacto que tenho tido com estrangeiros, que às vezes isso até pode parecer assustador! Porque veem um jovem com um mapa na mão e pressupõe que tem de o ajudar. É inato, e é imperativo.

 

E falam alto. Não como os italianos, mas falam alto!

E dizem muitos palavrões. No Porto não é assim tão raro ver uma mãe a “ensinar” o filho recorrendo a termos que não constam no dicionário. Só quem não anda de metro é que nunca viu os miúdos a serem disciplinados, ali mesmo, com duas ameaças de pares de estalos acompanhadas de palavras que fazem os alfacinhas corar.

 

O Porto é o Rio Douro e a ponte D.Luiz, são as fontainhas e a ribeira, o Piolho e a Fonte dos Leões; a praia, o surf, e o Estádio do Dragão; a Casa da Música e as caves do vinho do Porto; a Universidade, a praxe e as tunas; a rua de Santa Catarina e a das Galerias e as centenas de bares que abrem e fecham à medida que o Porto vai ganhando ou perdendo popularidade; são os hostels e o D. Henrique; a Avenida dos Aliados e os Clérigos; a Sé, a gastronomia; é Serralves e o Parque da Cidade; é o S.João e a Queima das Fitas.

 

Mas é muito mais do que isso! Para o bem e para o mal. Estudei no Porto e estou habituada a muitas coisas que sei que as pessoas de outras cidades não estão. A percorrer a cidade a pé, por exemplo. Ou a apanhar o autocarro de madrugada. Ou a vestir o traje académico e senti-lo a cheirar mal. Ou… a cumprimentar o pianista. Toda a gente do Porto sabe quem é o pianista. Ou a mulher da sopa. Lendárias, essas personagens.

 

Eu nem sequer moro no Porto mas, se me perguntarem, é no Porto que eu moro. Moro em Gaia. E o Porto, o Porto a sério, é muito mais do que o Porto. É Matosinhos e Gondomar e Maia e Valongo e Ovar e São João da Madeira. É quase Póvoa DE Varzim, agora com o metro.

 

Os portuenses têm um orgulho desmedido em si próprios. São exagerados, egocêntricos.

Admito que podíamos ser um bocadinho – só um bocadinho – menos focados em nós próprios. Mas eu nasci no Porto, estudei no Porto, e, por isso, padeço de todos esses males.

 

Não há cidade como a nossa, na nossa visão arrogante. 

 

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publicado às 13:12


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